Retomada do julgamento do Marco Temporal: decisão poderá ter consequências para os povos indígenas de todo Brasil

Retomada do julgamento do Marco Temporal: decisão poderá ter consequências para os povos indígenas de todo Brasil

Decisão tomada servirá de diretriz e poderá ter consequências para todos os povos indígenas do Brasil

Na última quarta-feira (07/06), o Supremo Tribunal Federal (STF) retomou o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365 que discute a aplicação da chamada tese do “marco temporal” para a demarcação de terras indígenas. O indígena Jucinei Fernandes Ukuyó Terena, acadêmico do curso de Direito da FADIR/UFGD e pesquisador colaborador do Observatório de Protocolos Comunitários, relatou que essa é mais uma tentativa de violação dos direitos dos povos originários. 

A tese do Marco Temporal é uma medida que restringe os direitos dos povos indígenas e injustamente limita a demarcação de terras com base em uma data arbitrária. Essa interpretação defende que apenas as terras ocupadas na data da promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988, sejam demarcadas. Tal interpretação é amplamente criticada por representar um retrocesso social, histórico e jurídico aos direitos constitucionais dos povos indígenas, ignorando sua existência anterior à Constituição de 1988 e desconsiderando as injustiças e violências cometidas contra eles ao longo dos séculos, e sobretudo a invasão criminosa de seus territórios. Além disso, favorece interesses de setores que buscam explorar os recursos naturais nos territórios indígenas.

O julgamento em questão é referente ao Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365, que trata de um pedido de reintegração de posse movido pela Fundação do Meio Ambiente contra a Fundação Nacional do Índio (Funai) e indígenas do povo Xokleng em Santa Catarina. A área em questão já foi identificada como parte de seu território tradicional pela FUNAI. No entanto, o ministro Nunes Marques proferiu um voto favorável ao “marco temporal”, enquanto o relator do caso, Luiz Edson Fachin, se posicionou contrariamente.

Durante a retomada do julgamento no último dia 07, o ministro Alexandre de Moraes afirmou em seu voto que a adoção de um marco temporal poderia significar a total ignorância de direitos fundamentais, defendendo que “a ideia do marco temporal não pode ser uma radiografia”. Ele declarou ser contra o “marco temporal” em seu voto, ressaltando a importância de não fechar os olhos para as situações enfrentadas pela comunidade indígena Xokleng. O ministro argumentou que quando há ocupação indígena ou disputa por terra, a posse deve ser destinada aos indígenas, enquanto os não-indígenas devem ser indenizados por melhorias realizadas de boa-fé.

Em casos diferentes, nos quais a ocupação da terra é feita por não-indígenas, o ministro sugeriu que eles recebam uma indenização completa, tanto pelo valor da terra nua quanto pelas melhorias realizadas de boa-fé.

Além disso, o ministro propôs a possibilidade de compensar os indígenas com outras terras, caso não seja viável conceder exatamente a área requerida, como nos casos em que já existe uma cidade no local. Ele também defendeu que o Poder Público seja responsabilizado pela ocupação irregular das áreas.

O voto do ministro Alexandre de Moraes apesar de defender a exclusão do Marco temporal, aplicou uma série de condicionantes que podem dificultar o processo de demarcação, e em outros casos confundir a demarcação com a desapropriação em desacordo com o art. 231 da Constituição.

O ministro André Mendonça pediu vista, suspendendo o julgamento para análise posterior.

André Mendonça tem 90 dias para devolver o processo para retorno do julgamento em plenário.

Em 2019, o STF reconheceu a repercussão geral desse recurso, o que implica que a decisão tomada terá consequências para todos os povos indígenas do Brasil.

O Observatório de Protocolos Comunitários destaca a importância de respeitar a história e a cultura dos povos indígenas, rejeitando o “marco temporal” e apoiando a luta pela garantia dos direitos dos povos originários. O que está em jogo é a garantia dos direitos dos povos indígenas ou a negação deles.

É fundamental garantir a demarcação e proteção das terras indígenas, assegurando o direito dos povos indígenas de cuidar de seus territórios e de serem consultados previamente em decisões que afetem suas vidas. A imposição de restrições aos direitos, como aquelas estabelecidas pelo ministro do STF, viola a Constituição Federal, convenções internacionais e os direitos garantidos pela legislação brasileira.

Diversas organizações indígenas e a sociedade civil têm se mobilizado contra o “marco temporal” e o Projeto de Lei 490/2007, que propõe alterações na legislação indigenista. É necessário garantir a participação efetiva dos entes federativos em todas as etapas do processo de demarcação e reverter esse retrocesso histórico e normativo que ameaça os direitos constitucionais dos povos indígenas no Brasil.

Para compreender mais sobre a temática, acesse:
https://cimi.org.br/2020/10/entenda-repercussao-geral-stf-futuro-terras-indigenas/

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